O plano de Putin para ficar até 2036 no comando da Rússia

Principal líder político do país há 20 anos, o ex-agente da KGB e presidente russo se movimenta agora para continuar no cargo até os 83 anos.

O presidente russo, Vladimir Putin, há 20 anos no poder, se movimenta agora para continuar à frente do país até 2036.

Nesta terça-feira (10/03), ele demonstrou seu apoio a uma proposta de mudança constitucional que essencialmente zeraria seu número de mandatos presidenciais. Afirmou, porém, ser a favor de limites às reeleições quando o país se tornar “politicamente maduro”.

Pelas regras atuais, Putin não poderia se candidatar novamente quando seu mandato atual terminar, em 2024.

Esta é quarta vez que ele ocupa o cargo. Entre 2008 e 2012, porém, o político ocupou o posto de primeiro-ministro, evitando violar a lei, que permite apenas dois mandatos consecutivos. Neste período, Dmitri Medvedev, seu afilhado político, foi o presidente russo, até que seu padrinho pudesse voltar a ocupar o cargo. Na prática, porém, as decisões de Putin ainda prevaleciam mesmo nesse período.

A proposta atual, segundo Putin, significaria “remover restrições para qualquer pessoa, incluindo o presidente atual, e permitir que eles participem em eleições futuras, naturalmente abertas e concorridas”.

“A princípio, essa opção seria possível, mas sob uma condição — se uma Corte Constitucional decidir que essa emenda não contradiz os princípios da Constituição”, afirmou, em discurso na Duma, a câmara baixa do Parlamento.

Se ela de fato entrar em vigor, Putin poderá conseguir mais dois mandatos de seis anos como presidente, até 2036, quando teria 83 anos.

Colapso soviético

O mandatário russo lembrou que o presidente americano Franklin D. Roosevelt ocupou o cargo por quatro mandatos seguidos (de 1933 a 1945, quando morreu) em razão da turbulência enfrentada por seu país à época (que incluíram os anos após a Grande Depressão econômica e também a Segunda Guerra Mundial). O caso, segundo ele, seria um exemplo de como limitações do tipo nem sempre fazem sentido.

“Quando um país está enfrentando choques e dificuldades como essas (…), a estabilidade talvez seja mais importante e deve ser uma prioridade”, disse, ressaltando que a Rússia ainda está se recuperando do colapso da União Soviética, em 1991.

A proposta de emenda foi aprovada nesta terça-feira pela Duma. Agora, ela será submetida ao voto popular, como parte de um pacote mais amplo de mudanças constitucionais apresentadas pelo governo.

Desde janeiro, Putin vem anunciando mudanças constitucionais sobre o equilíbrio entre os poderes na Rússia. Até ele apoiar abertamente a proposta que permitiria sua permanência no cargo, a suspeita era de que ele buscaria ocupar outro cargo no governo após 2024, como forma de manter sua influência no país.

Se aprovada em referendo, a proposta transferiria poderes da Presidência para o Parlamento. Horas depois do anúncio de seus detalhes, há dois meses, Medvedev, então primeiro-ministro e seu gabinete renunciaram.

Durante seu discurso anual sobre o Estado da União, Putin afirmou que a Duma ganharia “mais responsabilidade” e passaria a participar da escolha do primeiro-ministro e de seu gabinete.

No pronunciamento desta terça, Putin disse que “uma Presidência forte é absolutamente essencial”, mas acrescentou que a Duma “deveria ter poderes adicionais”.

As alterações são necessárias, afirmou, para “fortalecer nossa soberania, tradições e valores”, em um mundo que enfrenta desafios como novas tecnologias e o coronavírus.

No longo prazo, disse Putin, a Rússia “precisa de uma garantia de que as pessoas no poder possam ser trocadas regularmente”.

Protestos

Opositores russos convocaram protestos contra as emendas constitucionais.

Em mensagens no aplicativo de mensagens Telegram, o jornalista Ilya Azar afirmou que “Putin deixou, alegremente, seu destino nas mãos da Corte Constitucional (ele só quer, como é de seu feitio, manter o senso de incerteza), mas todos entendemos que tudo já foi decidido, e que Putin já decidiu ficar no poder por mais dois mandatos após a adoção das emendas constitucionais”.

“Isso é, obviamente, totalmente inaceitável, a Rússia não é a Bielorússia ou o Cazaquistão. Por isso, protocolamos na Prefeitura de Moscou hoje avisos de manifestações nos dias 21 e 22 de março”, disse.

Outros anunciaram uma reação imediata, com protestos de uma pessoa só (que, pela lei russa, não requerem permissão formal, mas ainda assim são frequentemente reprimidos pela polícia).

Para muitos, a aprovação pela Corte Constitucional seria apenas uma formalidade no processo.

“A probabilidade de que a Corte Constitucional vá aprovar a ação de zerar os mandatos de Putin é basicamente de 100%”, disse o comentarista político Grigory Golosov.